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A culpa é das estrelas: 11 capítulo.
A culpa é das estrelas: 11 capítulo.

Fiquei acordada até bem tarde lendo O preço do alvorecer. (Para acabar com o suspense: o preço do alvorecer é o sangue.) Não era nenhum Uma aflição imperial, mas o protagonista, o Sargento Max
Mayhem, era ligeiramente simpático, apesar de ter matado, pelas minhas contas, nada menos que cento e dezoito indivíduos em duzentas e oitenta quatro páginas.
Por isso acordei tarde na manhã seguinte, uma quinta-feira. Minha mãe seguia a seguinte política: nunca me acordar, pois um dos pré-requisitos do Doente Profissional é dormir muito. O que me deixou meio confusa, num primeiro momento, quando fui despertada pelas mãos dela em meus ombros.
— São quase dez horas da manhã — ela disse.
— O sono combate o câncer. Fiquei acordada até tarde lendo.
— Deve ser um livro e tanto — ela disse ao se ajoelhar ao lado da cama e me desconectar do enorme concentrador de oxigênio retangular, que eu chamava de Felipe, porque simplesmente tinha cara de Felipe.
Mamãe me conectou a um cilindro portátil e me lembrou que eu tinha aula.
— Foi aquele menino que deu isso para você? — ela perguntou.
— Com isso você quer dizer herpes?
— Você é impossível — mamãe comentou. — O livro, Hazel. Estou falando do livro.
— Sim, ele me deu o livro.
— Está na cara que você gosta dele — ela falou, as sobrancelhas arqueadas, como se uma observação dessas dependesse exclusivamente de um instinto maternal.
Dei de ombros.
— Eu disse que o Grupo de Apoio acabaria valendo a pena — continuou ela.
— Você ficou esperando lá fora o tempo todo?
— Fiquei. Levei coisas para ler. Mas isso não vem ao caso. Hora de sair para aproveitar o dia, minha jovem.
— Mãe. Dormir. Combate. Câncer.
— Eu sei, querida, mas você tem aula agora. Além disso, hoje é… — A alegria na voz da mamãe era evidente.
— Quinta-feira?
— Você esqueceu, de verdade?
— Talvez?
— Hoje é quinta-feira, vinte e nove de março — ela disse aquilo quase gritando, o sorriso estampado no rosto.
— Você parece estar muito feliz só de saber que dia é hoje — gritei também.
— HAZEL! HOJE É SEU TRIGÉSIMO TERCEIRO MEIO ANIVERSÁRIO!
— Ahhhhh! — falei. Minha mãe era totalmente adepta da prática de maximizar as celebrações de datas comemorativas. HOJE É O DIA DA ÁRVORE! VAMOS ABRAÇAR ÁRVORES E COMER BOLO! COLOMBO TROUXE VARÍOLA PARA OS NATIVOS DA AMÉRICA; PRECISAMOS FESTEJAR A DATA COM UM PIQUENIQUE! etc. — Já que é assim, feliz trigésimo terceiro meio aniversário para mim — completei.
— O que você quer fazer neste dia tão especial?
— Voltar para casa depois da aula e assistir ao maior número possível de episódios de Top Chef de uma vez só para bater o recorde mundial nessa categoria?
Mamãe esticou o braço e pegou, da prateleira acima da minha cama, o Azulzinho, o urso de pelúcia azul que eu tinha desde, tipo, um ano de idade — quando ainda era socialmente aceitável dar para os bichos de pelúcia nomes inspirados na cor deles.
— Você não quer ir ao cinema com a Kaitlyn ou com o Matt? —
Esses eram meus amigos. Era uma ideia.
— Pode ser — respondi. — Vou mandar uma mensagem de texto para a Kaitlyn e ver se ela quer ir ao shopping ou fazer alguma coisa depois da aula.
Mamãe sorriu, abraçada ao urso.
— Ir ao shopping ainda é considerado um programa legal? — ela perguntou.
— Eu me orgulho muito de não saber o que é ou não é um programa legal — respondi.
* * *
Mandei um torpedo para a Kaitlyn, tomei banho, vesti uma roupa e mamãe me deu uma carona até a escola. A matéria do dia era Literatura
Norte-americana, uma aula sobre Frederick Douglass dada numa sala tipo anfiteatro praticamente vazia. Foi muito difícil manter os olhos abertos. Quarenta minutos depois de iniciada a aula de noventa minutos, a Kaitlyn respondeu.
Legal. Feliz Meio Aniversário. Castleton às 3h32?
A Kaitlyn possuía uma vida social concorrida, organizada visando o melhor aproveitamento do tempo dela. Respondi:
Boa ideia. Te vejo na praça de alimentação.
Mamãe me levou de carro direto da escola para a livraria ao lado do shopping, onde comprei tanto o Alvoradas à meia-noite quanto o Réquiem para Mayhem, os volumes seguintes da série "O preço do alvorecer".
Depois fui andando até a ampla praça de alimentação e comprei uma Coca Zero. Eram 3h21.
Enquanto lia, dei uma espiada nas crianças que brincavam num navio pirata na área de recreação do shopping. Duas atravessavam um túnel repetidas vezes, engatinhando, e não se cansavam daquilo, o que me fez lembrar do Augustus Waters e de seus lances livres carregados de existencialismo.
Mamãe também estava na praça de alimentação, sozinha, sentada em um canto, achando que eu não conseguia vê-la, comendo um sanduíche de filé com queijo e lendo alguns papéis. Artigos médicos, provavelmente.
Aquelas leituras pareciam não ter fim.

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